A disparada no preço dos alimentos mudou a vida dos brasileiros nos últimos meses. Pesquisa do Datafolha mostra que 58% dos consumidores estão comprando menos comida para driblar a inflação. O aperto no orçamento também levou metade das pessoas a cortar gastos com água, luz e gás.
Em Dix-Sept Rosado, na zona Leste de Natal, a pensionista Maria da Glória, de 78 anos, conta que equilibrar as contas virou desafio diário. “Tenho que controlar tudo, do contrário, não dou conta de pagar água e luz. O café é o que está mais caro”, reclama. A bebida, aliás, é um dos itens que mais pesaram no bolso. Segundo o Datafolha, 50% trocaram a marca do café por outra mais barata e 49% diminuíram o consumo.
As trocas para economizar vão além do café. A aposentada Raimunda Moura, de 75 anos, trocou a carne bovina pelo frango. Vanessa Frossard, que trabalha em uma loja de autopeças, passou a comparar preços entre supermercados e aproveitar promoções. “Conheço bem os mercados do bairro e olho os encartes para aproveitar o melhor preço”, explica.
A estratégia de substituir marcas também virou regra para o servidor público Carlos Barbosa, de 51 anos. “Se a marca está mais barata, eu levo. Hoje, preço vale mais que marca”, diz.
Além de mudar hábitos, muitos consumidores estão buscando outras fontes de renda. Quase metade (47%) declarou ao Datafolha que procura ganhar dinheiro extra. A crise também afetou a compra de medicamentos: 36% dos entrevistados disseram que passaram a comprar menos remédios.
O impacto da inflação também pesou no pagamento das contas. Segundo o levantamento, 32% deixaram de quitar dívidas e 26% atrasaram alguma despesa doméstica. A pesquisa foi feita de 1º a 3 de abril, com 3.054 pessoas em 172 cidades do País.
Apesar da alta, 61% dos entrevistados disseram que ainda têm comida suficiente em casa. Para 25%, a quantidade é insuficiente.
Para o professor Thales Penha, do Departamento de Economia da UFRN, a troca de marcas e de produtos é natural em tempos de inflação. “Se a manteiga sobe muito, o consumidor vai para a margarina. Se a carne de primeira encarece, procura a de segunda”, explica.
O presidente da Associação dos Supermercadistas do Rio Grande do Norte (Assurn), Mikelyson Góis, confirma que a mudança de hábitos é visível. “O consumidor que comprava produtos premium agora vai para marcas mais baratas. Quem já comprava o intermediário, desceu ainda mais”, afirma.
Dono de um mercadinho na zona Oeste de Natal, Arnaldo André diz que a clientela está muito sensível aos preços. “Qualquer R$ 0,20 de diferença já muda a venda”, conta.
Segundo Góis, a alta dos preços dificulta até o estoque dos supermercados, que precisam calcular melhor as compras para evitar perdas. Produtos como café, carne e arroz são os mais complicados de gerenciar.
Entre quem ganha até dois salários mínimos, o impacto da inflação é ainda maior. O Datafolha aponta que 67% desse grupo compram menos alimentos. Entre eles, 45% reduziram a compra de remédios e 32% deixaram de pagar contas da casa.
O professor Thales Penha lembra que quem tem renda mais baixa tem menos opções para se proteger da alta dos preços. “Muitos vão morar com parentes, andam mais de bicicleta e enfrentam condições de vida piores”, afirma.
O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo 15 (IPCA-15) de abril mostrou alta de 0,43%, puxada pelos alimentos, mas o ritmo desacelerou em relação a março. Para Penha, a expectativa é de estabilização nos próximos meses, com melhora da safra agrícola.
“O café, no entanto, pode demorar mais para ter preços estáveis, porque houve problemas de produção no Brasil e no Vietnã”, alerta o professor.
Enquanto isso, os consumidores seguem adaptando a rotina e o carrinho de compras ao novo cenário.
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