Enquanto prefeitos e Forças Armadas colhem confiança, levantamento mostra descrédito generalizado em figuras centrais da República
Em meio a um cenário político cada vez mais polarizado e institucionalmente instável, a mais recente pesquisa do Instituto Datafolha lança luz sobre um sentimento crescente entre os brasileiros: a vergonha. Segundo os dados divulgados neste sábado (28), os principais representantes dos Três Poderes — Supremo Tribunal Federal, Congresso Nacional e Presidência da República — enfrentam índices preocupantes de rejeição popular.
O Supremo Tribunal Federal, frequentemente protagonista de embates políticos e decisões controversas, é hoje fonte de constrangimento para 58% da população. Apenas 30% dos entrevistados afirmaram sentir orgulho da Corte máxima do país. O Congresso Nacional segue na mesma direção: 58% dos brasileiros têm vergonha da Câmara dos Deputados, e 59% dizem o mesmo sobre o Senado.
Na Presidência, o retrato não é mais animador. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva carrega uma taxa de rejeição simbólica — 56% sentem vergonha de sua atuação, contra 40% que expressam orgulho.
A pesquisa também evidencia como a visão sobre o Supremo é moldada pelas convicções políticas. Entre os eleitores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), 82% afirmam ter vergonha do STF, e apenas 12% demonstram orgulho. A desaprovação salta para 91% entre os simpatizantes do PL. Do outro lado, a base petista tenta sustentar a imagem da Corte: 52% dos eleitores de Lula sentem orgulho do STF, e 36% dizem ter vergonha.
Esse abismo opinativo é alimentado por episódios recentes que envolveram diretamente os ministros do Supremo — de decisões sobre a Lava Jato à cassação de mandatos e a regulação das redes sociais. Além disso, a postura do tribunal diante dos ataques institucionais durante o governo Bolsonaro e seu papel no processo de inelegibilidade do ex-presidente ainda reverberam.
As convicções religiosas influenciam de maneira relevante a leitura que os brasileiros fazem das instituições. Entre os evangélicos, 66% se dizem envergonhados do STF, enquanto apenas 22% sentem orgulho. Já entre os católicos, o julgamento é menos severo: 56% relatam vergonha e 33%, orgulho.
A faixa etária também interfere nos índices de aprovação. Jovens entre 16 e 24 anos demonstram maior simpatia pelas Forças Armadas, com 65% de orgulho. Em contraste, adultos entre 45 e 60 anos são os mais críticos, com 43% de vergonha.
Apesar do desencanto com os altos escalões da República, algumas instituições ainda desfrutam de crédito junto à população. A figura dos prefeitos lidera a confiança: 62% dos entrevistados disseram sentir orgulho de seus líderes municipais. Os governadores vêm logo atrás, com 52% de aprovação.
O povo brasileiro também aparece como fonte de orgulho para 61% dos entrevistados — dado simbólico, mas revelador de uma confiança interna frente à crise das elites políticas.
As Forças Armadas, frequentemente vistas como instituição de estabilidade, mantêm imagem relativamente preservada. Mais da metade dos entrevistados (55%) demonstram orgulho dos militares, enquanto 36% expressam vergonha. A avaliação é quase idêntica entre eleitores de Lula (52%) e Bolsonaro (54%), o que confere à instituição um raro status de consenso nacional.
Os números da pesquisa Datafolha não apenas expõem um mal-estar com os principais atores do cenário político brasileiro, mas apontam para um fosso crescente entre representantes e representados. A desconfiança nos Poderes da República reforça o discurso de ruptura, ainda que velado, e lança alertas sobre a saúde democrática do país.
Com uma população cada vez mais crítica e polarizada, as instituições terão de enfrentar um desafio inadiável: reconquistar a legitimidade perdida antes que o desgaste se torne irreversível.
Mín. 22° Máx. 30°